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Por uma politica de qualidade para os portos

Por uma politica de qualidade para os portos
04/05/2016

Já está consagrado que porto não se refere apenas ao lugar ao longo de um curso d´água, estuário ou baía onde navios atracam para carregar e descarregar mercadorias. Entende-se como porto uma complexa gama de atividades que se desenvolvem no entorno do “porto” propriamente dito. São terminais retroportuários alfandegados ou não, empresas de transporte terrestre, ferrovias, armazéns, silos, despachantes, agentes marítimos, mão de obra, praticagem, fornecedores, autoridades intervenientes e a própria autoridade portuária.

Há uma corrente, na qual me insiro, que diz, prioritariamente, que “é a carga que atrai o navio para determinado porto”. Se esse axioma for verdadeiro, quais seriam as razões pelas quais o cliente escolhe este ou aquele porto para exportar ou importar suas mercadorias? Há naturalmente os fatores geográficos e de acessibilidade. Porem esses fatores muitas vezes não são decisivos. O cliente sempre irá procurar um porto onde possa encontrar bons custos, agilidade, confiabilidade e eficiência. E esses atributos não ficam restritos somente ao terminal portuário por onde sua carga será movimentada, mas deverá incluir toda a cadeia citada no primeiro parágrafo.

De nada adiantará o porto contar com um moderníssimo terminal de containers, por exemplo, se o processo de desembaraço for lento, truncado e caro se o transporte cais/terminal retroportuário for ruim, caro e não confiável. Ou ainda, se a agência marítima que representa o armador for ineficiente e criar dificuldades com sua documentação; se os despachantes aduaneiros que atuam naquele porto não oferecerem um serviço eficiente e profissional.

Quando fui Diretor Comercial do Porto de Itajaí, entre 2009 e 2012, mesmo consciente de que éramos reconhecidos como um complexo portuário eficiente, sabíamos que aquilo era uma percepção empírica e se tornava necessário ir um passo além e transformar essa percepção em algo visível e palpável. Juntamente com o Sebrae, iniciamos o esboço de um programa destinado a qualificar a cadeia logística toda, com a criação de um “selo de qualidade” que seria concedido a quem aderisse voluntariamente ao programa, participando de um treinamento, e viesse a se comprometer a cumprir determinadas metas de eficiência e qualidade. O trabalho ainda poderia ser utilizado em sua divulgação empresarial ou institucional, indicando ao mercado que o empreendimento é um “operador” qualificado. O conceito original estava baseado num programa elaborado pelo Porto de Valência, através da Fundação Valenciaport, que lá se chama “Marca de Garantia”. Infelizmente, o projeto não foi adiante, por restrições orçamentárias.

Não basta que, individualmente, as empresas envolvidas na cadeia logística de um porto se qualifiquem por meio de programas tipo ISO ou outros. É necessário que o conjunto seja visto como um organismo interdependente e que precisa funcionar de forma harmoniosa, transmitindo ao usuário uma sensação de que lá sua carga terá um tratamento adequado em todas as etapas.

O programa do porto espanhol prevê o estabelecimento de alguns compromissos gerais que o conjunto dos participantes se comprometem a aderir como sistemas informatizados comuns, cumprimento de normas e acordos firmados, promoção da formação de pessoal, sistemas de qualidade implementados, compromisso de trabalhar com informações fidedignas, transparência no faturamento dos serviços e um processo de melhoria contínua.

Além disso, os participantes devem se comprometer com determinadas garantias particulares, relativas a cada segmento, cujo não cumprimento pode inclusive ensejar multas pecuniárias. Aqui se trata principalmente de prazos e procedimentos a tempo e a hora.

Um programa desses naturalmente exige um grande comprometimento e um alto grau de maturidade de toda a comunidade portuária, liderada pela Autoridade Portuária, em seu papel de “sindico do shopping center”, mas incluindo as entidades de classe, os trabalhadores, o CAP, os órgãos intervenientes e os terminais públicos e privados localizados na área de abrangência do porto.

As empresas e entidades que aderirem ao programa – e se qualificarem – recebem um “selo de qualidade”, que servirá como indicador ao mercado de que aquele prestador de serviço é confiável. E o conjunto desses selos transmitirá ao público usuário a percepção de que vale a pena encaminhar suas cargas para aquele porto. Essa percepção acaba chegando ao armador, pois não só será também beneficiário dessa cadeia virtuosa, mas como também perceberá que, ou atende àqueles clientes que desejam operar naquele porto, ou os perderá para a concorrência.

No momento em que a concorrência se acirra, em que os armadores vão se consolidando ou juntando-se em “joints” e os portos e terminais lutam fortemente para aumentar ou manter seu “Market Share”, um programa como esse, embora trabalhoso, poderá ser o diferencial entre o crescimento ou a perda de relevância de um porto.

Quando uma comunidade portuária consegue se unir na construção de uma politica de qualidade coletiva, essa unidade resulta também num processo de apoio à Autoridade Portuária na busca de melhorias e adequação da infraestrutura de acessos aquaviários e terrestres, sem as quais essa mesma politica de qualidade pode ficar comprometida ou relativizada.

Finalizando, cito Tom Peters: “A maior parte dos programas de qualidade cai por uma de duas razões: eles têm sistema sem paixão ou paixão sem sistema. É preciso ter ambas.”. Fica, portanto, o desafio aos gestores portuários: busquem um zom sistema de qualidade, mas com muita paixão.

Escrito por:Robert Granthan

Fonte: Guia Marítimo