O Ministério Público Estadual (MPE) investiga supostas fraudes, incluindo superfaturamento, em licitações (concorrências públicas) na Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), estatal que administra o Porto de Santos. Inquérito Civil foi instaurado pela Promotoria do Patrimônio Público de Santos para apurar favorecimento de empresas em contratos com a Codesp em troca de dinheiro para campanhas políticas.
Segundo denúncia feita ao MPE pelo advogado Raphael Cardoso dos Reis, ex-funcionário da companhia, o atual vice-governador Márcio França, que preside o PSB no Estado, indicou pessoas para cargos comissionados em setores estratégicos da Codesp com um objetivo: favorecer determinadas empresas em contratos com a estatal. Essas mesmas empresas teriam repassado mais de R$ 3 milhões em doações eleitorais para França e para o PSB.
A investigação considera que o vice-governador, que foi deputado federal entre 2007 e 2014, teria facilidade em lotear cargos, principalmente no setor jurídico da Codesp, porque seu partido comandava o Porto. Seis pessoas são apontadas como indicadas por ele.
Uma delas é a advogada Bernadete Bacellar do Carmo Mercier, que já foi assessora de França quando ele era deputado. Outra é o ex-deputado estadual Fausto Figueira (PT), que também atuou na Codesp e recebeu doação eleitoral de empresa contratada pela companhia.
A Tribuna teve acesso ao inquérito, aberto em 2016, que já tem centenas de páginas em 10 volumes. São pelo menos 16 contratos que fariam parte do suposto esquema de corrupção, totalizando R$ 468 milhões.
Foram assinados entre 2007 e 2015 com quatro empresas: Galvão Engenharia, Serveng Civilsan S.A, Van Oord Dragagens do Brasil Ltda, DTA Engenharia Ltda (veja destaque). Os serviços são ambientais, de dragagem e obras viárias.
Valores
A DTA Engenharia – 10 contratos com a Codesp para serviços ambientais, somando aproximadamente R$ 50,3 milhões. Deu R$ 50 mil para a campanha de Márcio França a deputado federal.
Van Oord Dragagens do Brasil – 4 contratos, somando 89,3 milhões. O maior foi de R$ 36 milhões para dragagem do canal portuário. Doou R$ 1,9 milhão ao Diretório Nacional do PSB em 2010. A legenda repassou R$ 2 milhões à campanha de França no mesmo ano.
Galvão Engenharia – 1 contrato para execução de obras no sistema viário da Margem Direita do Porto. Valor: R$ 40,9 milhões. Doou R$ 565 mil para Diretório Nacional do PSB.
Serveng Civilsan – 1 contrato para obras de alinhamento do Cais de Outeirinhos, ao custo de R$ 287,2 milhões. Deu R$ 250 mil para Diretório Nacional do PSB.
Quem investiga?
O inquérito civil para investigar as denúncias foi aberto em 11 de fevereiro de 2016 pelo 14º promotor de Justiça de Santos, Eduardo Taves Romero, do MPE, ao receber ofício do Ministério Público Federal (MPF). O MPF foi o primeiro a receber a denúncia, mas afirmou não ter atribuição para o caso.
Romero arquivou o inquérito, porém, o Conselho Superior do Ministério Público, grupo formado por 11 procuradores, pediu continuidade nas investigações por acreditar que existem indícios suficientes para isso. O promotor de Santos pediu, então, afastamento. A 12ª Promotoria assumiu o caso, mas está sem promotor fixo, portanto a investigação ocorre em sistema de revezamento, prejudicando a agilidade da apuração.
Criminal
Também foi aberto inquérito criminal para apurar a denúncia, que foi arquivado pela Procuradoria-Geral de Justiça, que chefia o MPE. Foi levada em consideração a alegação de falta de provas, por parte dos investigados.
Márcio França afirma que tem a consciência tranquila e acredita na Justiça (Foto: Alberto Marques/AT)
França alega calúnia
O vice-governador Márcio França diz que em quase 35 anos de mandatos eletivos nunca respondeu a processo criminal. “Um advogado, que exerce atualmente cargo de confiança no Governo do Maranhão (PCdoB e PT), de forma irresponsável, ao ser demitido da Codesp por incompetência, me acusou de montar um esquema de fraudes”.
França alega que entrou com representação criminal por calúnia contra o denunciante. E ressalta que a denúncia criminal contra ele, França, foi arquivada.
“A investigação civil ainda permanece, porque envolve outros nomes, e, ao final, deverá também ser arquivada. Ninguém chuta cachorro morto e me sinto super vivo para enfrentar as maldades e maledicências que por ventura eu possa atrair”.
O vice-governador afirma que tem a consciência tranquila e acredita na Justiça. Segundo ele, as pessoas filiadas ao PSB que atuavam na Codesp lá estavam por ter relação com a cidade de Santos.
“Não foi indicação minha. Além disso, as pessoas citadas não ocupavam cargos em níveis de decisão para influenciar contratos da estatal. Ou seja, trata-se do uso político de um caso já arquivado em âmbito criminal”.
Ainda conforme França, todas as doações foram feitas ao PSB nacional na campanha de reeleição do então governador de Pernambuco, Eduardo Campos. “As empresas citadas prestam serviços em Santos e também ao Porto de Suape, em Pernambuco. E em todos os casos as doações obedeceram a legislação em vigor”.
Resposta da Codesp
Em nota, a estatal diz que as investigações se referem a gestões anteriores. “A Codesp já enviou as informações solicitadas e se colocou à disposição para os esclarecimentos necessários”.
Codesp informa que investigações estão voltadas às gestões anteriores (Foto: Luigi Bongiovanni/AT)
Investigados negam acusações
A empresa DTA afirmou que as doações feitas na eleição de 2010 ocorreram “dentro da lei eleitoral” vigente à época e que elas “não guardam qualquer relação com os contratos firmados com a Codesp”. A empresa afirmou que “pauta todas as suas atividades dentro dos mais elevados princípios éticos e morais”.
A Van Oord disse que teve de acionar a Justiça para conseguir ser contratada pela Codesp porque havia sido inabilitada do certame. A empresa afirmou que as doações políticas foram legais.
A Galvão Engenharia e a Serveng Civilsan afirmaram que as contratações ocorreram mediante licitação pública e que as doações eleitorais foram declaradas à Justiça Eleitoral.
Bernadete Mercier negou irregularidades. Ela afirmou que o departamento Jurídico “não tinha influência sobre as decisões tomadas nas licitações”.
Fausto Figueira acha que “a denúncia é baseada em fato nenhum” e que nunca exerceu função ligada às licitações. “O fato de ter uma doação para a minha campanha não tem relação com qualquer contrapartida” (com informações Estadão Conteúdo).
Fonte: A Tribuna